Terrorismo e Intolerância: Duas Faces da Mesma Moeda



 

“Neste momento, é muito fácil e tentador cair em clichês racistas sobre a ‘mentalidade muçulmana’, o ‘caráter árabe’ ou outras bobagens desse tipo.”

(Amos Oz, As duas faces do fanatismo, artigo publicado na Folha de São Paulo, 13/9)

Em um lúcido artigo escrito em pleno dia do atentado - ainda mais lúcido se imaginarmos que o autor, um escritor judeu morando em Jerusalém e portanto em um alvo potencial de qualquer futuro contra-ataque dos terroristas de Bin Laden   - Amos Oz condenou a onda anti-islâmica e anti-árabe que começava a surgir e, falando de corda em casa de enforcado, defende a desocupação da Palestina.

Mas a questão mais importante do texto está mais no fundo, diz respeito não apenas a muçulmanos, árabes ou não, judeus e americanos, mas a toda a humanidade. Entre outras coisas, ele diz: “Tais manifestações [sons ameaçadores de sentimentos anti-islâmicos indiscriminados] não constituem reação apropriada a este crime - pelo contrário, elas servem aos propósitos daqueles que o perpetraram” e com isto chega à essência da questão.  Das muitas dicotomias que foram criadas de todos os lados para definir esta guerra - Cruzados e muçulmanos, bons e maus, civilização e terror, etc. - uma em especial interessa a todos, a que diz respeito a um conceito estrito ou geral de humanidade.

É preciso decidir de que lado se está, ou do lado que considera a todos os humanos como irmãos e membros de uma mesma espécie, todos dignos dos mesmos direitos e respeito mútuo, ou se está do lado dos que acham, de alguma forma, que seu grupo representa a verdadeira humanidade - ou ao menos a parte dela que vale a pena - enquanto o resto é uma espécie de sub-raça que mal vale a pena ser tolerada.

Não há, nem pode haver, distinção mais significativa do que esta, nem referencial mais claro para guiar a ação. A distinção, curiosamente, irmana os dois extremos desta luta sem quartel: terroristas e intolerantes.  Ambos defendem uma interpretação estrita da humanidade, por motivos que não deixam de ser muito similares quando analisados de perto.  Para os terroristas de Bin Laden, os judeus e americanos - e em maior escala todos os demais seres humanos que não professam o Islã e mesmo os muçulmanos (porque uma definição estrita de humanidade leva a uma definição estrita de muçulmano também) - podem ser mortos porque, em última análise - não são seres humanos, nem tem o direito de serem diferentes do que eles querem que eles sejam.

O mesmo pensam os intolerantes, em especial aqueles que disfarçam seus preconceitos por detrás de uma defesa da civilização ocidental, do progresso ou de valores subjetivos deste tipo. Tal como Bin Laden, negam a identidade humana àqueles que não aceitam a Revelação apresentada pelos valores ocidentais. Resumindo a proposição dos dois: quem não aceita meus valores como os únicos universais não é humano.

 

Texto de Alexandre Gomes (Hilal Iskandar), jornalista, convertido ao Islã em janeiro de 1995.

 

Home                                                       Artigos