Deixem os Americanos Conhecerem o Lado Palestino da História


 

 

Mulher palestina sendo atacada na rua por israelenses, sob o olhar conivente dos soldados israelenses

 

Na aldeia de Al-Khader no último mês, uma mulher idosa usando um vestido tradicional se aproximou do grupo de americanos visitando a área. Em frente a ela parou uma criança, olhando timidamente para o chão. Seu olho esquerdo tinha sido retirado, substituído no Hospital John Hopkins por uma réplica de vidro que não combinava com sua cor natural. Ele tem 4 anos de idade.

Momentos depois, se juntava ao menino uma menina ainda começando a andar, com uma cicatriz sobre seu olho esquerdo. Vestindo um pijama amarelo com desenhos do ursinho Teddy, ela poderia se passar por uma criança americana média, com exceção de que a maioria dos bebês americanos não recebem tiros na cabeça dados por soldados.

Estas foram algumas das visões horrendas que eu testemunhei nos territórios palestinos mês passado, como um membro da Fellowship of Reconciliation Peacebuilders Delegation. A viagem, uma excursão com o objetivo de promover a não-violência, destacou a necessidade de observadores internacionais na região, algo que toda nação envolvida apóia, exceto Israel e os Estados Unidos.

Foi minha segunda vez nos territórios em menos de um ano. Aprender de primeira mão sobre o povo palestino tem sido ao mesmo tempo uma honra e uma bênção, mas algo que a maioria dos americanos deixa de apreciar por causa dos estereótipos pervasivos que afligem os palestinos nos Estados Unidos.

Desde o meu retorno, eu tenho encontrado vizinhos com seus comentários, tais como ‘Eles não odeiam os americanos?’  e, ‘ Você não estava com medo dos terroristas?’

Estas sensibilidades denotam a grande necessidade de desmistificar as suposições negativas que minam as percepções americanas sobre o povo palestino.

No meio dos dois recentes bombardeios suicidas em Israel, é raro ver a palavra ‘palestino’ na imprensa sem estar seguida por  ‘terroristas’, ‘extremistas’, ou outra variação desumanizante. As realidades básicas da vida palestina devem ser entendidas se americanos pretendem se aproximar do conflito de modo justo e em seu próprio contexto.

Em outras palavras, ou admitimos que realidades históricas e políticas específicas levam à ações violentas, ou sugerimos tacitamente que estas ações são um aspecto peculiar da cultura palestina/islâmica, em cujo caso estaremos nos engajando na mais primária forma de racismo.

Relatar fatos simples pode ajudar a clarificar porque os palestinos se revoltam, algumas vezes com violência. Insinuar que eles fazem isto sem razão ou como resultado de um anti-semitismo inato, não apenas projeta ignorância, mas também impede uma paz verdadeira baseada em justiça e reconhecimento mútuo.

O fato mais importante é a continuada ocupação da terra palestina por Israel, que viola leis internacionais. Israel tem sido repetidamente ordenado pelas Nações Unidas a se retirar dos territórios.

Um desfile sem fim de resoluções do Conselho de Segurança desde 1976 identificaram a ocupação ilegal de Israel como a fonte primária do conflito, e ainda assim os Estados Unidos se mantém sozinho com Israel tentando bloquear a implementação de qualquer solução baseada nas estipulações internacionais das quais tanto Israel quanto os Estados Unidos são uma parte.

A isto se associam dificuldades econômicas nos territórios, um resultado direto dos fechamentos de Israel e da dependência palestina de Israel por bens e serviços. Mais grave são as matanças indiscriminadas de manifestantes desarmados, assassinatos extra-judiciais e a humilhação diária nos pontos de checagem e postos militares. Estas condições ajudam a alimentar a fúria de um povo oprimido, e se formos falar de violência elas não podem ser ignoradas.

Fundamentalmente, Israel é um estado de apartheid, como admitido por Nelson Mandela e o Bispo Desmond Tutu, dois líderes sul-africanos bem versados no assunto.

Pouco ultraje é expressado nos Estados Unidos, sobre a divisiva sub-estrutura legal de Israel.

Quando o Afeganistão recentemente requereu que os budistas usassem uma identificação especial, a resposta dos Estados Unidos foi extraordinária, e ainda assim nada é dito sobre as linhas religiosas mais explícitas de Israel.

Cristãos e muçulmanos são requeridos a carregar cartões de identidade declarando sua religião, a partir da qual movimentos e privilégios são estabelecidos. As licenças dos carros também tem um código de cores baseado na religião do motorista. Apenas os judeus tem garantidos os benefícios integrais da cidadania.

A solução mais viável foi talvez a articulada pela avó do menino de 4 anos em Al-Khader, que, apontando para uma torre militar a partir da qual as crianças eram baleadas, exclamou, ‘Nós só queremos que eles saiam’.

Os palestinos não odeiam os americanos. Os americanos, de fato, como qualquer visitante estrangeiro aos territórios, são tratados de modo tremendamente caloroso e hospitaleiro.

Palestinos se ofendem, entretanto, com um governo americano que continua a ajudar Israel inquestionavelmente em sua opressão ao povo palestino, e sua ocupação ilegal da terra palestina.

Nós americanos devemos nos ofender também.

 

Texto original: 'Let Americans Learn the Palestinian Side of the Story' de Steven Salaita, publicado dia 14 de agosto de 2001 no Houston Chronicle.

 

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