A Idade Dourada da Civilização Islâmica |
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O
período mais brilhante da civilização islâmica foi sem dúvida o dos
califas abássidas de Bagdá (750-1258) e dos omíadas espanhóis
(755-1492). “Em uma época
quando o resto da Europa estava mergulhado no mais sombrio barbarismo,”
declara Gustave Le Bon, “Bagdá e Córdoba, as duas grandes cidades
onde o Islã dominava, eram centros de civilização que iluminaram todo
o mundo com a luz de seu brilhantismo.” Através de uma inscrição encontrada sobre a entrada das universidades na Espanha durante a época muçulmana, pode se perceber a importância atribuída ao conhecimento: “O
mundo é sustentado por quatro pilares: a sabedoria do instruído, a
justiça do grande, as orações dos virtuosos, e o valor do bravo.”
Deve
ser notado que a sabedoria encabeça a lista, o que não surpreende
quando se recorda que o Islã glorifica o aprendizado em vários versículos
do Alcorão, proclama através dos lábios de seu Profeta que “a pena
dos sábios é mais preciosa que o sangue dos mártires”,
e invoca o crente para “procurar o conhecimento, mesmo que
tenha que ir tão longe quanto a China para encontrá-lo.” Por vários
séculos os muçulmanos permaneceram fiéis a este princípio de sua
religião. “Por
quinhentos anos, “ escreve Jacques C. Riesler, “o Islã dominou o
mundo através de seu poder, seu conhecimento, e sua civilização
superior. Sucessor do tesouro filosófico e científico dos gregos, o
Islã transmitiu este tesouro, após enriquecê-lo, para a Europa
ocidental. Assim foi capaz
de ampliar o horizonte intelectual da Idade Média e causar uma impressão
profunda na vida e pensamento europeu.” A
fundação em 830 da Bait al Hikmat (Casa do Conhecimento) em Bagdá
pelo califa Al Mamun (813-833) foi um dos eventos notáveis da Idade Média.
Não se pode negar a importância do papel desempenhado por esta
instituição - uma espécie de amálgama de academia, biblioteca e
centro de traduções - na transmissão para o mundo ocidental do legado
da civilização da Antiguidade. Este
estabelecimento ilustre, composto de sábios cristãos, judeus e árabes,
ocupou-se inicialmente de “conhecimento estrangeiro”.
A ciência e a filosofia gregas, os trabalhos de Galeno, Hipócrates,
Platão, Aristóteles, e de comentadores como Alexandre de Afrodis, Temístenes,
John Filoponos, etc.
A Bait al
Hikmat foi a pedra fundamental da Escola de Bagdá, que exerceu sua
influência a partir da segunda metade do século XV.
Esta escola detém o mérito de ter garantido a continuidade da
civilização, restaurando a cadeia do conhecimento humano que foi
quebrada brutalmente no século VI, pelo declínio e queda de Roma.
Se
a civilização islâmica tivesse se restringido meramente a salvar
conhecimentos da Antiguidade, guardando-os cuidadosamente e
transmitindo-os intactos para
as gerações futuras, o serviço prestado à humanidade já teria sido
inestimável. Mas não foi
este o caso. Os sábios e filósofos da Escola de Bagdá herdaram o espírito
e a tradição da Escola de Alexandria, ampliaram e enriqueceram o
conhecimento da Antiguidade através de adições novas e originais em
todos os ramos da ciência, através de incontáveis descobertas nas
artes aplicadas, e também, e acima de tudo, através de novos métodos
de pesquisa e investigação. “O
que caracteriza a Escola de Bagdá,” escreve Sedillot, cuja autoridade
no assunto é incontestável, “é o espírito verdadeiramente científico
que governa todos os seus trabalhos: prosseguir do conhecido ao desconhecido, observar fenômenos
acuradamente de modo a deduzir causas de efeitos, aceitar como fato somente o
que havia sido provado por experimentos, estes eram os preceitos
ensinados pelos mestres. Os
árabes do século IX estiveram em poder de um rico método científico
que muito tempo depois, nas mãos de cientistas modernos, concorreu para
suas maiores descobertas.” H.
A . R. Gibb confirma em nossos dias a declaração feita um século atrás
por Sedillot : “Através da concentração de seus pensamentos em
eventos individuais”, diz ele, “os sábios muçulmanos foram capazes
de desenvolver um método científico muito superior ao dos seus
predecessores gregos ou alexandrinos... Foram responsáveis pela introdução
ou restauração do método científico na Europa medieval.”
A
Escola de Bagdá não apenas fez uma contribuição poderosa ao Renascimento
da Europa, escreveu de Sismondi, mas também trouxe esclarecimento à
toda a Ásia.
O
conhecimento islâmico encontrou seu rumo no Hindustão por volta de
1016 sob os auspícios de Mahmud de Gazna; alcançou os seljúcidas, via
Omar Khayam, por volta de 1076; os mongóis via Nasr ed Din Thusi,
fundador do Observatório de Maragá, em 1260, e os otomanos por volta
de 1337. Foi introduzido na China por volta de 1280 durante o reinado de
Kubilai Khan, através de Ko-Cheu-King, e o timurida Ulug Beg ergueu um
novo e imperecível monumento em sua honra em 437 em Samarcandia.
É
impossível negar, à luz de estudos recentes, que a totalidade do
conhecimento grego foi completamente repensado pelos árabes, e que sem
este trabalho de renovação
de sua parte, a Renascença não poderia ter surgido.
Pesquisas
científicas na Espanha muçulmana dirigidas pela nova Escola Francesa
de Estudos Orientais, lideradas por Levi Provençal, e o trabalho de
historiadores espanhóis notáveis como Sanchez-Albornoz, Asin Palacios,
Gomez Moreno e Emile Garcia Gomez confirmam
totalmente esta teoria. “Sem
dúvida, não se pode falar atualmente sobre ‘as trevas da Idade Média’”,
escreve Sanchez-Albornoz; “deve lembrar-se que lado a lado com uma
Europa enfraquecida pela miséria e decadência, existiu uma civilização
resplandecente da Espanha muçulmana. Os líderes de estudos árabes na Espanha estão abrindo hoje
novos horizontes onde a disseminação, efeito e brilhantismo desta
cultura hispano-mourisca estão relacionados.
Eles demonstraram o papel decisivo que ela desempenhou no
desenvolvimento da filosofia, ciência, poesia, e na verdade em todos os
aspectos da cultura na Europa cristã.
Fonte: Livro "Muslim Contribution to Civilization" de Haidar Bammate. Traduzido e editado por Maria Moreira, webmistress do Islamic Chat. Visite também os artigos "As Origens da Civilização Islâmica" e "A Medicina Árabe e o Ocidente". Ver bibliografia utilizada pelo autor
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